Pesquisa do jornalista Sergio Cruz, do IHGMS

A caminho de Cuiabá, onde assumiu o governo a 8 de setembro, o coronel João José da Costa Pimentel para “apressar a marcha, adiantou-se com reduzida comitiva, deixando para trás, incumbido do transporte de carga, mais moroso, o ajudante de ordens Antonio Correa da Costa Pimentel.
Dormia o tenente, descuidado, à beira do Itiquira, quando o assaltaram os índios, à noite de 9 de outubro de 49.
Transpassado por flechas, ainda padeceu durante dez horas dolorosas até sucumbir.
Em represália, o Presidente, ao saber do triste fim do seu filho, organizou duas expedições, em Cuiabá e Miranda, que não mais encontraram nenhum agressor”.¹
Jornal do Rio de Janeiro dá a notícia com detalhes:
O 1° tenente de artilharia Antonio Correa da Costa Pimentel, filho do sr. Coronel João José da Costa Pimentel, atual presidente da Província de Mato Grosso, foi assassinado pelos índios selvagens que infestam as margens da estrada de S. Paulo a Cuiabá. Eis alguns pormenores deste triste acontecimento:
O tenente saiu daqui em companhia de seu pai, sob cujas ordens ia servir na província de Mato Grosso. Chegados a Piracicaba, na província de S. Paulo, o coronel separou-se do filho, deixando-o com o grosso da bagagem, a fim de acelerar a sua viagem, ao que nos consta, com o fim de entrar em Cuiabá antes de terem princípio as eleições secundárias para um deputado que elege aquela província. Ao passarem o rio Itiquira, o tenente Pimentel e seus companheiros de viagem viram vestígios de por ali andarem ou terem estado índios: os vestígios consistiam em pegadas nas margens do rio, e destroços de casas pertencentes ao capitão Antonio de Arruda e Silva, que haviam sido incendiadas. Inexperientes ou descuidados, desprezaram completamente aqueles indícios e em vez de procurarem campos onde pernoitassem, atravessaram o rio e arrancharam-se à margem direita. Seriam dez horas da noite, pouco mais ou menos, quando o infeliz tenente, sentindo-se vivamente perseguido pelos mosquitos, levantou-se da rede em que descansava e acompanhado de um escravo foi com uma luz procurar outro lugar para armar o seu leito, o que efetivamente conseguiu. Os índios que das matas espreitavam os incautos ou inexpertos viandantes, depois que os viram alojados, procuraram reconhecer, pelo meio que lhes é habitual, se tinham ou não adormecido, para isso imitando em torno do pouso os sons de diversas aves e animais. Certo do estado indefeso das vítimas, dispararam sobre o tenente Pimentel, que envolto num lençol branco oferecia seguro alvo, onze flechadas no mesmo tempo, das quais uma atravessando-o do quadril ao ventre, feriu-o mortalmente, e outra foi empregada num sargento, sendo porém, leve o ferimento deste. O tenente pode ainda arrancar a flecha com suas próprias mãos, mas dentro em poucos instantes sucumbiu com terríveis convulsões..
Os selvagens, como ao depois se soube, seguindo pela margem do rio São Lourenço, cometeram mais duas ou três mortes e várias depredações.
O presidente da província, informado dessas excursões e da desgraçada morte de seu filho, expediu, como é ali de prática tradicional, três bandeiras à caça dos selvagens, das quais uma seguiu pela estrada de Goiás, outra pela do rio Piquiri e a terceira partiu da povoação de Miranda.²
Em sua primeira mensagem aos deputados, o governador identifica os atacantes e reconhece o fracasso das bandeiras punitivas:
Os índios bravios – Coroados – cometeram neste ano grandes hostilidades, tanto na estrada de Goiás, como na nova de S.Paulo, perecendo vítima deles o 1° tenente ajudante de ordens do comando das armas Antonio Correa da Costa Pimentel. Mandei contra eles três bandeiras, que pouco ou nada fizeram, ou por estar mui avançada a estação chuvosa ou por má direção dos respectivos comandantes, e enquanto elas operavam no sertão, eles batiam os moradores da estrada de Goiás, incendiando-lhes casas e roças e fazendo-lhes todo o gênero de hostilidades e ultimamente até atacaram o próprio destacamento da Estiva daqui 30 léguas, pelo que me vi na necessidade de o reforçar. Se o governo imperial, a quem pedi auxílio para batê-los, não o conceder, farei este ano seguir novamente contra os mesmos uma outra expedição, afim de ao menos desinfestar as vias de comunicação desta província com a capital do império.³
FONTE: ¹Virgílio Correa Filho, História de Mato Grosso, Fundação Júlio Campos, Várzea Grande, 1994, página 527. ²Correio da Tarde (RJ), 10 de janeiro de 1850. ³Presidente João José da Costa Pimentel, Mensagem à Assembleia provincial de Mato Grosso, Cuiabá, 3 de maio de 1850.