A polícia do coronel Totó Paes, que aliado aos irmãos Murtinho, expulsou o senador Generoso Ponce, do Estado, cerca a fazenda Conceição, do primeiro-vice-presidente João Paes de Barros, que acabava de romper com o governo, e prende um grupo de oposicionistas refugiados naquele estabelecimento rural, vizinho da usina Itaicy, de Totó Paes, prende a todos, exceto o vice-presidente que é obrigado a assinar a carta de renúncia, seleciona um grupo que é levado a Cuiabá e separa dezessete que são executados e atirados no lugar conhecido por baia dos Garcêz, no distrito Santo Antonio Rio Abaixo, atual Santo Antonio do Leverger.
O episódio, que se transformou no discurso da oposição, estigmatizou o período Totó Paes, encerrado com a sua morte em 1906. O fato, de repercussão nacional, foi relatado pelo coronel João Paes de Barros, proprietário da usina onde as vítimas foram aprisionadas:
Feita a seleção dos que deveriam ir por terra a Cuiabá, soube que foram todos amarrados de braços para trás pela escolta que os conduzia, seguindo assim a pé até o lugar denominado “Potreiro”, onde, junto a uma baia, conhecida pelo nome de “Garcêz”, foram um a um fuzilados, saqueados e os cadáveres com os ventres partidos em cruz para não boiarem, lançados na água à voracidade das piranhas, ficando aí postada uma guarda até que desaparecessem.
Da usina foram ouvidos os tiros, pois, em linha reta, é pequena a distância àquela baia, a qual posto que situada na mesma margem em que está a usina, fica-lhe em frente, pela grande curva que forma ali o rio Cuiabá.
Antes da partida da escolta, Eugênio Vital que tinha hábito de andar grande distância a pé, pediu que lhe permitissem seguir a viagem a cavalo, embora preso e devidamente seguro; a esta súplica foi-lhe respondido;- “que não era muito longa a distância a caminhar, que logo chegariam ao fim”. E assim foi.
Ao cair da noite parte da escolta, que seguira com os presos por terra, regressara à usina, narrando sem reservas os horrorosos detalhes da carnificina havida na baia dos Garcêz.
Autor da época realça o episódio com assombroso tom de dramaticidade:
Cardumes de piranhas ferozes, na sua fúria carnívora, se incumbirão de raspar ou últimos vestígios daqueles corpos – não ficará provas da façanha.
Assim pensam os autores do horripilante morticínio. O bem estudado dos detalhes macabros, entremostra a premeditação dos mandantes. Mas a natureza, obediente a Deus, abre no ano seguinte uma exceção: em 1902 a baia do Garcêz secou.
E dezessete ossadas humanas, alvas sob o sol adusto, atestavam ali o crime inominável.
FONTE: Generoso Ponce Filho, Generoso Ponce um chefe, Pongetti, Rio de Janeiro, 1952, página 311.
FOTO: Album Graphico de Mato Grosso, Corumbá, 1914.