domingo, 19/05/2024

Pesquisa do jornalista Sergio Cruz, do IHGMS

Encurralado e fustigado pela forte cavalaria inimiga, com insuficiência de munição, falta de víveres e tendo como justificativa, retroceder à fronteira para “aguardar algumas probabilidades de nos abastecer e gozar de pequeno repouso”, a força brasileira de ocupação ao norte do Paraguai, inicia em 8 de maio de 1867, a célebre retirada da fazenda Laguna, ocupada em 6 de maio. O episódio foi descrito pelo tenente Taunay, escriba da expedição e seu mais ilustrado protagonista:

Quando no dia seguinte, o sol se levantou (era um dia dos mais serenos) já estávamos em ordem de marcha com as mulas carregadas, os bois de carro nas cangas e tudo quanto restava do gado encostado ao flanco dos batalhões, de modo a seguir todos os movimentos da coluna.

Às sete da manhã, o corpo de caçadores desmontados, a quem competia o turno da vanguarda, abriu a marcha, tendo a seguir bagagens e carretas, circunstância que nos impediu de transpor facilmente um riacho avolumado pelas chuvas dos dias antecedentes. (…)


Avançávamos em boa ordem quando subitamente viva fuzilaria se fez ouvir: era a nossa vanguarda que renteando um capão de mato fora atacada por uma partida de infantaria, ali emboscada. Tinham algumas balas vindo cair por cima das fileiras num grupo de mulheres que marchavam tranquilamente ao lado dos soldados; tal algazarra provocaram que não sabíamos o que poderia ter sucedido. Pouco durou este terrível tumulto; investindo resolutamente com o inimigo, nossa gente o desalojou impelindo-o até o primeiro declive do planalto, onde estava a fazenda da Laguna. Mas ali formaram-se os paraguaios, novamente resistindo algum tempo, achegando-se logo depois, passo a passo, dos cavalos; afinal enquanto alguns, já montados, disparavam a todo dar de réguas, outros fingiam resistir para proteger os camaradas que fugiam a bom fugir, inteiramente derrotados.


Os combates duraram praticamente o dia inteiro, com baixas nos dois lados, conseguindo as tropas de Camisão mover-se penosamente até às margens do Apa-Mi, onde acamparam ao entardecer:

Caíra a noite, profundamente escura. Estávamos estrompados de cansaço, a vista escura e o espírito abalado por tantas e tão variadas impressões cujas imagens acabavam por se confundir. Não houve quem armasse tenda ou barraca. Dormimos em grupos, formados quase ao acaso, de três, quatro ou mais, conchegados uns aos outros, cobertos em comum por capotes, ponchos, mantas, com quanto encontráramos; cada qual com o fuzil, o revólver ou a espada ao alcance da mão e o chapéu desabado sobre os olhos, para se resguardar do orvalho, tão copioso que tudo encharcava.



FONTE: Taunay, A retirada da Laguna, Edições Melhoramentos, São Paulo, 1942, página 71.

FOTO: A retirada da Laguna, composição de Álvaro Marins